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Para Além da Margem do Rio: A Jornada de Esperança da Rosinha

Águas altas e canoas improvisadas interpunham-se frequentemente entre Rosinha Eugénio e os cuidados vitais de que necessitava. No entanto, num canto remoto da província da Zambézia, a sua determinação revelou-se mais forte do que a corrente que ameaçava mantê-la isolada. Esta é a história da luta inabalável de uma mãe pela saúde da sua família.

Rosinha é uma mulher solteira de 35 anos do distrito de Namacurra, na província da Zambézia, que vive na remota ilha de Marroda, na localidade de Mbaua. É mãe de quatro filhos, dois dos quais, Milagre (13) e Tércia (11), também vivem com o HIV. Desde muito cedo, Rosinha enfrentou a dura realidade do isolamento geográfico e da informação limitada sobre saúde. A unidade de saúde mais próxima ficava do outro lado de um rio que tinha de ser atravessado em canoas improvisadas. Esta viagem perigosa e

As chuvas frequentes no seu distrito faziam com que o caudal do rio aumentasse, tornando a travessia ainda mais difícil, e a falta de vias de acesso alternativas manteve-a afastada da unidade sanitária. Sem cuidados pré-natais adequados, Milagre nasceu com HIV. Dois anos depois, a história se repetiu. Durante a sua segunda gravidez, Rosinha evitou os serviços de prevenção da transmissão vertical do HIV. Apesar do aconselhamento dos profissionais de saúde, ela continuou a faltar às consultas, o que resultou em longos períodos sem medicação. Consequentemente, a sua segunda filha, Tércia, também foi diagnosticada com HIV.

Com o tempo, a saúde de Milagre foi-se deteriorando. Ele sofria de diarreia constante, crescimento lento e falta de apetite - sinais de alerta que Rosinha já não podia ignorar. Desesperada, recorreu à medicina tradicional, mas os resultados foram escassos; Milagre continuava a adoecer.“Já não conseguia dormir. Sentia-me culpada por não ter seguido os conselhos da unidade sanitária”, recorda Rosinha. O peso da sua culpa era enorme, mas a mudança parecia ainda fora de alcance, até ao dia em que atravessou o rio e conheceu uma equipa de agentes comunitários de saúde.O peso da sua culpa era enorme, mas a mudança parecia ainda fora de alcance, até ao dia em que atravessou o rio e conheceu uma equipa de agentes comunitários de saúde.

Os agentes de saúde trabalhavam na organização de um evento de mobilização da comunidade, onde eram dadas palestras sobre prevenção e tratamento do HIV. Motivada, Rosinha decidiu abordar a um deles, informando-o sobre a doença do seu filho. O agente comunitário de saúde ofereceu-se para acompanhá-la a casa e ver de perto o estado da criança. “Esse gesto mudou tudo para mim. Percebi que não estava sozinha e que podia lutar pela vida dos meus filhos”, diz Rosinha. Ao ver o estado da criança, o agente de saúde prometeu apoiá-la para que ela e o filho pudessem visitar a unidade sanitária no dia seguinte. Sem hesitar, Rosinha aceitou a ajuda e dirigiu-se à unidade sanitária de Mbaua, onde era esperada pela equipe de provedores de saúde.

Rosinha e o seu filho foram recebidos na unidade sanitária e, devido à sua fraca adesão ao tratamento, foram inscritos no aconselhamento de adesão reforçada durante três meses. Esta estratégia centra-se nos pacientes em TARV que faltam frequentemente às consultas, interrompem o tratamento ou têm carga viral não controlada. Durante a primeira sessão, uma equipa de profissionais de saúde - incluindo um psicólogo, um clínico e um educador de pares avaliou as razões subjacentes às interrupções recorrentes do tratamento de Rosinha. Os principais obstáculos identificados foram as barreiras de transporte, a distância e as dificuldades psicossociais, que conduziram a um plano personalizado para reintegrar Rosinha nos cuidados de saúde para o HIV.

Milagre e Tércia foram submetidos a uma avaliação clínica para detectar doenças relacionadas com o HIV. Nesse mesmo dia, as crianças foram integradas nos serviços de tratamento antirretroviral (TARV). Rosinha recebeu medicação TARV para os três, bem como um plano de apoio nutricional para os seus filhos. Para garantir o acesso contínuo da sua família ao TARV, foi designada uma mãe mentora para dar apoio comunitário e evitar mais interrupções no tratamento. Pela primeira vez, Rosinha sentiu-se capacitada para enfrentar a sua condição e garantir que os seus filhos recebessem os cuidados de que necessitavam.

Após um período desafiador, Rosinha Eugénio e seus filhos, Milagre e Tércia, reentegraram-se aos cuidados de saúde e agora celebram a vida em família ao lado da dedicada equipe de profissionais de saúde que os acolheu na unidade de saúde de Mbaua, no distrito de Namacurra.

No entanto, o caminho para a recuperação não foi isento de obstáculos. Numa das viagens para a unidade de saúde, a canoa que transportava Rosinha, Milagre e Tércia virou no rio. As três foram resgatadas pela comunidade, mas o trauma permanece. Mesmo assim, Rosinha nunca desistiu. “O medo foi imenso, mas o meu amor pelos meus filhos é mais forte. Não posso desistir”, diz com firmeza.

Os profissionais de saúde continuaram a monitorizar Rosinha e os seus dois filhos regularmente, assegurando que seguiam o plano de tratamento. Com o apoio da sua família e da sua mãe mentora, Rosinha conseguiu um acesso consistente à medicação. Com o passar do tempo, a saúde de Milagre e Tércia estabilizou-se, permitindo que Rosinha reduzisse as suas visitas à unidade sanitária. Rosinha começou a receber medicamentos para si e para os seus filhos de três em três meses, o que ajudou bastante pela localidade remota de onde provinha.

Graças à melhoria na sua saúde, Rosinha e os seus filhos começaram a participar em brigadas móveis organizadas na sua comunidade, uma solução eficaz para pacientes que vivem em áreas remotas. Determinada a mudar o seu futuro, Rosinha manteve-se firme no seu tratamento e teve mais dois filhos, ambos nascidos sem HIV.

A mobilização comunitária e as brigadas móveis promovidas pelas autoridades distritais de saúde na província da Zambézia, em parceria com a C-Saúde e financiadas pelo PEPFAR, foram fundamentais para transformar a vida de Rosinha. “Quando os profissionais de saúde vêm até nós, sentimos que as nossas vidas são valorizadas. É um alívio enorme para muitas famílias”, explica.

Hoje, Rosinha Eugénio é mais do que uma simples utente dos serviços de saúde. É uma líder na sua comunidade, uma inspiração para outras mulheres e a prova viva de que o amor e a resiliência podem ultrapassar até as maiores adversidades. A sua história demonstra claramente que, com o apoio e a determinação da comunidade, é possível criar um futuro cheio de saúde e esperança.

Determinada a Vencer: Apesar de enfrentar grandes desafios e o perigo de atravessar o Rio Marroda em canoas improvisadas, Rosinha Eugénio nunca deixou de lutar pela saúde de sua família.

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